*O Cão Nunca Te Abandona: Uma Análise Psicocomportamental Sobre a Solidão na Doença*
Por Abilio Machado Psicoarteterapeuta
*A experiência da doença grave ou prolongada pode ser um divisor de águas nos relacionamentos.* Muitas pessoas que enfrentam desafios de saúde relatam que amigos e familiares, aos poucos, vão se afastando. Em contrapartida, quem tem um cão percebe que ele permanece ao lado, incondicionalmente. Essa diferença de comportamento entre humanos e cães pode ser analisada sob uma perspectiva psicocomportamental, considerando fatores como instinto, laços emocionais e o peso das expectativas sociais.
*O Afastamento Humano: Medo, Culpa e Egoísmo*
Na pergunta, autoreflexiva do membro do Grupo dos Velhos Noéis: Sr. Donato Noel– *“Minhas irmãs não cuidaram dos pais, vão cuidar de mim?”* – reflete uma dura realidade. Muitas pessoas experimentam o abandono dentro da própria família. Mas por que isso acontece?
*Medo da fragilidade* – A doença lembra a todos que somos vulneráveis. O afastamento pode ser uma defesa psicológica contra essa realidade incômoda.
*Esgotamento emocional* – Nem todos têm estrutura para lidar com o sofrimento de um ente querido. Alguns se afastam para evitar a dor do envolvimento.
*Conflitos familiares* – Ciúme, inveja e disputas passadas podem minar o senso de responsabilidade entre irmãos e parentes.
*Egoísmo e conveniência* – Muitas relações humanas são baseadas na troca. Quando uma pessoa adoece, e não pode mais “oferecer” algo, algumas pessoas simplesmente perdem o interesse.
A sociologia e a psicologia indicam que a responsabilidade pelo cuidado geralmente recai sobre poucos indivíduos dentro de uma família. Muitos assumem que *“alguém mais fará isso”* e se isentam. Essa dinâmica tem nome: *difusão de responsabilidade* (Darley & Latané, 1968), um fenômeno em que as pessoas se sentem menos compelidas a agir quando há outras que poderiam fazê-lo.
*O Cão: Um Vínculo Livre de Julgamentos e Expectativas*
Diferente dos humanos, um cão não pondera se vale a pena estar ao lado de seu tutor doente. Seu vínculo é baseado na lealdade emocional e no instinto de manada. Alguns fatores explicam esse comportamento:
*Apego incondicional* – Diferente de amigos e parentes, um cão não mede a relação por ganhos ou perdas. Seu laço emocional independe da situação do tutor.
*Lealdade instintiva* – Como descendente dos lobos, o cão vê seu tutor como parte de sua "matilha" e, na natureza, um membro doente não é abandonado.
*Percepção emocional apurada* – Estudos indicam que cães são capazes de reconhecer emoções humanas, como tristeza e dor (Custance & Mayer, 2012). Isso os faz permanecer mais próximos quando o tutor precisa.
*Ausência de julgamento social* – Enquanto amigos podem se afastar por desconforto ou por não saber como agir, um cão simplesmente está ali, presente e acolhedor.
*O Valor do Amor Verdadeiro*
O afastamento de amigos e familiares em momentos de doença pode ser doloroso, mas revela uma verdade: *nem sempre quem está ao nosso redor tem o compromisso de permanecer.* Por outro lado, a presença inabalável de um cão nos lembra do que é um amor puro, sem cobranças ou condições.
Ao enfrentar a solidão da doença, o mais importante é cultivar relações baseadas na autenticidade. *Nem todos os amigos desaparecerão, assim como nem todos os familiares se esquivarão. Mas aqueles que ficarem, humanos ou cães, são os verdadeiros companheiros de jornada.*
Obs.: este artigo foi escrito a partir da postagem ilustrativa no grupo a que faço parte. Quando uma frase, figura ou situação aluga um triplex nos meus pensamentos tenho que expor a Análise Psicocomportamental, as vezes vou mais longe incluindo a Filosofia e a Teologia.
*Bibliografia*
CUSTANCE, Deborah; MAYER, Jennifer. Empathic-like responding by domestic dogs (Canis familiaris) to distress in humans. Animal Cognition, v. 15, n. 5, p. 851-859, 2012.
DARLEY, John M.; LATANÉ, Bibb. Bystander intervention in emergencies: Diffusion of responsibility. Journal of Personality and Social Psychology, v. 8, n. 4, p. 377-383, 1968.
HARE, Brian; WOODS, Vanessa. The Genius of Dogs: How Dogs Are Smarter Than You Think. Dutton, 2013.
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